Espaço Terapêutico Psique

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A Psique e a Dor

fotopsiqueeadorAS MUITAS FACES DA DOR

O objeto do presente estudo é a dor. A dor, dentro dos seus conceitos mais correntes e comuns a todo ser humano, bem como nos aspectos mais subjetivos, onde cada um sente e sofre o seu tormento, que lhe dói de forma diferente dos demais.
A minha dor é diferente da sua. A forma que tenho de sentir e expressar a minha dor é diferente para cada um de nós. É diferente o que ela representa para mim e para você. Vamos enfrentá-la ou não e conforme essas diferenças ela influenciará a nossa vida de forma totalmente diversa.

Assim, o que é a dor? O que pode diferenciar o sofrimento do paciente terminal, quando a morfina não mais atua, daquele experimentado por quem viveu perdas materiais e afetivas muito além de sua capacidade de elaborá-las e que adoece, sofre, chora e deseja morrer? O que escolhe a dor e se fustiga por motivos de expiação religiosa dos pecados, porque está cometendo um ato voluntário, sua dor é menor?

Então , dor é uma palavra insuficiente para explicar, em sua plenitude, toda a complexa gama de sua abrangência.

· USO DA DOR

V. era aquela pessoa que costumavam chamar "poliqueixosa". A tudo respondia com alguma forma de dor, através da qual o aprendizado da vida lhe ensinara encontrar uma forma eficaz de atingir seus objetivos. Chega à terapia com o marido e três dos quatro filhos (19, 17 e 8 anos) O outro de 14, estava gripado e com uma crise de asma.

Magra, suspirosa, tinha um jeito muito próprio de mover os olhos para cima quando algo não a agradava ou queria dar ênfase a uma fala. Parecia buscar nos céus uma iluminação qualquer, algo parecido com uma santa de igreja.

Todos pareciam estar atentos àquele sinal e calavam ou mudavam de assunto, mas sempre mostravam-se assustados e tensos.

O relato principal eram as dores de V., como todos sofriam e tinham pena de alguém tão frágil.

Ela era a mais nova de 3 irmãos. Os dois mais velhos eram fortes, saudáveis, ambos casados e com filhos. Não mantinham entre si laços estreitos, apenas alguns telefonemas em certas datas, como aniversário e Natal. Os pais, mortos há anos, eram descritos como pessoas que sempre entendiam e defendiam a filha. Sempre condescendentes, como faziam falta! E, novamente os olhos marejados voltavam-se para cima. Todos seguram as suas mãos, como se dissessem : "mas, nós estamos aqui!" V. casara-se cedo, interrompendo os estudos, com o objetivo de continuá-los depois, o que jamais fizera. "Você sabe, a família, os filhos..." Novamente os olhos para cima representavam o tamanho daquela renúncia.

Teve os filhos de parto normal, em casa. Conta das gravidezes com o mesmo olhar que dispensava palavras e que parecia dizer : "sofri como ninguém!" Para confirmar, o marido conta que os vizinhos de dois quarteirões escutaram os seus gritos. Os filhos se mexem em suas cadeiras. Conta que o marido era funcionário público, inteiramente dedicado ao trabalho e à família. Assim como fora seu pai. (Novamente o olhar para cima, e o marido reage com um leve sorriso, quase imperceptível, como se sentisse gratificado). Era o encarregado de orientar os estudos das "crianças" e dos cuidados gerais da casa, sobretudo quando a mamãe estava com dor, ou seja, quase todos os dias. Ele sofria de taquicardia, que sempre se agravava quando via a mulher gemendo. O seu grande medo é que ela morresse e esse medo contagiava a todos.

Clinicamente, os exames de V. eram normais. Recentemente, sentia dores na bexiga e urinar era um tormento que os médicos não sabiam explicar. Passara por fases de dores lancinantes na coluna, no intestino, outras nas quais parecia não conseguir respirar direito. Uma fase seguia-se à outra e passava sem deixar explicação, apenas parecia que as dores do momento eram maiores que as anteriores. Achava que nascera para sofrer, que jamais teria saúde -(novamente os olhos para o alto).

Não tinham amigos, raramente saíam para algum passeio, dependia sempre "das dores da mamãe". A casa era silenciosa, sobretudo quando a mãe estava dormindo ou descansando. Aí, todos andavam de vagar, não falavam, pois qualquer ruído tinha como conseqüência os gemidos e suspiros.

V. sofria e fazia sofrer. Suas dores davam-lhe o controle absoluto de tudo e todos. Era um exemplo vivo da força da fraqueza. Poderíamos desconsiderar a importância das dores de V? Desprezar o seu significado por perceber-lhes o aspecto manipulador? Ou procurar entender o que elas representavam, seu papel no contexto de vida familiar, a sua linguagem, decodificar o que diziam e escondiam? Poderiam eles encontrar, com isso, novas formas de ser no mundo?

· A DOR NO TEMPO

Voltamos ao questionamento: o que é a dor? A "dor sem objeto" não é dor?

Existem formas perversas, desprezíveis, de dor? As "dores da alma", inexplicáveis e tantas vezes ridicularizadas, são menos sofridas que as "justificadas" por uma doença física? Ou, ao contrário, poderiam ser consideradas mais doídas exatamente por esse aspecto misterioso, que atinge e confunde tantas vezes o desejo de ajuda do médico que precisa de provas concretas, científicas, de localizações anatômicas exatas onde possa atuar? Não são essas dúvidas parte das dores daquele profissional?

Tempos existiram onde essas perguntas nada representariam. O físico e o psíquico eram , para os gregos, partes de uma mesma unidade indissolúvel e interdependente. O cristianismo reverte essa concepção. Estabelece o físico como a sede do pecado, que precisa ser posto de lado em função do espírito, este destinado a chegar aos Céus quando se "libertasse" do peso terreno, que era pó e ao pó retornaria.

Freud tenta a reunificação físico-psíquica, ao estudar a influência das emoções nas doenças físicas. Estavam abertas as portas da psicossomática e para a antevisão de novos conceitos científicos e filosóficos.

Enquanto dos gregos a Freud os avanços conceituais foram lentos, seculares, fortemente defendidos por preceitos culturais que pareciam eternos, o século XX revolucionou essa temporalidade. Houve uma explosão, idéias se complementam e anulam. O que é certo hoje, não o é amanhã. A ciência pôs todo o universo de critérios de pernas para o ar.

A relevo cristão do espírito passou para o físico e as explicações para o enfermar humano ora são genéticas, morfológicas, neurofisiológicas, metabólicas. O indivíduo deixou, outra vez, de ser uma unidade psicofísica influenciada pelo social para ser novamente cindido e dessa vez em muitas partes, como se cada uma delas tivesse uma existência autônoma.

As leis de mercado entraram em ação e contribuíram para essa nova ordem de pensamento, onde tentam provar a razão das dores em algum processo biológico, independente de quem o sofre. Lucra o mercado, expandem-se os conhecimentos científicos, a fisiologia humana é conhecida minuciosamente e cada vez mais. Com tudo isso, o ser humano sofre menos?

· FUGA E ENFRENTAMENTO

X. era filho de imigrantes, que vieram para o Brasil na época da Segunda Guerra. Suas grandes pelejas, entretanto, foram enfrentadas aqui : a língua, os hábitos diferentes, a pobreza, a saudade, a solidão. O pai, era o que se poderia chamar "uma máquina". Firmara o propósito de vencer na vida e perseguiu esse objetivo sem descanso e sem deixar que os outros descansassem. Teve dois filhos homens, que não tiveram infância, saíam da escola para trabalhar na loja do pai, dali para os deveres escolares, para a cama e assim sucessivamente por anos e anos. Jamais ousavam pedir ao pai para brincar com os colegas ou entre si, jamais reivindicavam um brinquedo, uma distração. Os fins de semana também eram passados na loja, arrumando estoques, fazendo limpeza. A mãe dividia o seu tempo, obsessivamente, entre a loja, a casa e a prole. Jamais levantara a voz para contestar o marido ou defender os filhos. Reclamar, naquela família, não era apenas proibido, era desconhecido. X. formou-se e foi exercer a profissão em outra cidade, onde casou com uma moça de sua mesma origem. Esta mudança, se largamente ansiada, não foi isenta de culpas e conflitos. Era o filho pródigo que se afastava, deixando o pai com as obrigações de prover a família, sobretudo agora que o irmão mais novo não parecia muito disposto a seguir as ordens paternas. Metera-se com um grupo de amigos estranhos e estava estranho também.

Fuga, libertação, raiva, medo da nova vida, culpa, tudo se misturava em X. Estava com 30 anos e aparentava mais, era baixo, seu o peso maior do que seria prudente.

Chega ao consultório por recomendação médica, após longa peregrinação por cardiologistas. Sentia dores no peito e achava que ia infartar. Todos os exames físicos eram normais, mas as dores e a sensação de morte iminente o deixavam confuso, sofrido, paralisado. Sua voz era baixa, a cabeça baixa, assumia toda uma postura corporal de tristeza e desalento. Não "sentava" na poltrona, "desabava", como se o seu corpo pesasse muito, estivesse muito cansado e precisasse encolher-se, abrigar-se.

Sofre especialmente quando, por obrigação profissional, tem que enfrentar pessoas poderosas, para defender as suas idéias e interesses de seus clientes. Este fator, ter uma voz que jamais tivera diante do pai, exacerbava as suas dores a tal ponto que, tantas vezes, sentia-se impossibilitado e deixava de comparecer aos encontros de trabalho porque "estava doente", mesmo sabendo que isso lhe traria prejuízos financeiros.

Tomava antidepressivos há algum tempo, sem grandes resultados, pois bastava uma "ameaça" para recolher-se em sua concha e curtir a sua dor.

Ao mesmo tempo em que trabalhava em terapia os seus conflitos antigos e atuais e estabelecia correlação entre eles, foi incentivado a desenvolver atividades físicas. Freqüentava a ginástica e passou a interessar-se por futebol, uma paixão infantil jamais realizada. Tudo isso fazia com certo entusiasmo e relativa freqüência. Em certas épocas, porém, coincidentes com as de maiores desafios no trabalho, sentia dores fortes nas coxas e panturrilhas, não conseguindo exercitar-se. Nessas fases andava com dificuldade, "se arrastava", como se dissesse: "me empurre, me carregue, eu não dou conta".

Aos poucos, sua forma de lidar com os desafios foi mudando. "Perdoou" seu pai e sentiu-se "perdoado" por ele. Aprendeu técnicas de relaxamento e passou a considerar o corpo não como caixa acústica dos sofrimentos, mas como prazer potencial. Hoje, não padece mais da neurose cardíaca e sua pernas parecem dizer: "podemos levar você onde você precisa ir, mesmo que tenha medo".

Visita a casa dos pais uma vez por ano e não se deixa contagiar por aquela forma de vida, que permanece a mesma.

· EM QUE PONTO ESTAMOS?

Enquanto sucedem-se as pesquisas e estudos sobre o tratamento da dor, enquanto discutem-se as suas causas, o ser humano padece.

A maioria desses estudos recorre a entrevistas estruturadas, questionários validados ou em fase experimental, técnicas estatísticas, etc. Alguns são considerados inconclusivos pelo tamanho reduzido das amostras, por discordância de resultados ou por falhas metodológicas. Outros escondem propósitos comerciais. Ou provam que placebos podem igualar ou superar os benefícios de certos medicamentos. Efeitos colaterais precisam ser medidos e avaliados. Tantos garantem: essa medicação é eficaz contra isso e aquilo e os laboratórios ganham rios de dinheiro. Até se ver que há, no mínimo, exagero.

Mas são tentativas, e nesse ponto estamos nós.

Modernas abordagens no tratamento da dor incluem analgésicos mais ou menos potentes, exercícios para melhorar o condicionamento físico, acupuntura, calor, etc, e algumas terapias que "ensinam" novas formas de conduta. Estes "ensinamentos", porém, são precários, como o são os seus resultados, pois servem mais ao imediatismo que a uma solução mais profunda e duradoura. Eles descuidam (ou não ouvem) o "tom" pessoal da dor, tudo o que ela diz por não dizer, a linguagem oculta do sofrimento que fala mil línguas que se confundem e desabam as estruturas como uma Torre de Babel. Temos que transformar ruído em som, torná-lo audível e compreensível. Traduzir essa linguagem oculta e fazê-la inteligível, iluminar as áreas escuras dos nossos porões, montar esse quebra-cabeça de peças dispersas para que ele assuma uma figura que faça sentido.

Portanto, algo está posto de lado. O excesso de cientificismo esquece e impede a observação do indivíduo como este ser único, que não pode ser dissociado de sua história, de sua cultura, valores , parâmetros e sentimentos. Ele não é um órgão que dói, é um ser que sofre como um todo.

Os traumas do passado estão inscritos em nossas células, são parte delas, como os genes que herdamos de nossos antepassados. Se esses traumas não forem decodificados, entendidos e trabalhados, continuarão encontrando expressões físicas que os simbolizarão em dores e seus corolários.

· POSSO MATAR A DOR QUE ME MATA

Y., 52 anos, sempre fora considerado um homem de sucesso. Combativo, incisivo, sabia bem o que queria e sempre achava um jeito de impor as suas idéias. Diziam que ele era "um trator", passava por cima de tudo e todos.

Exercia há anos um cargo de chefia em uma empresa de renome, era considerado e, às vezes, temido. Acompanhou a ascensão da empresa e sentia-se "meio dono" dela. Sobretudo, "dono da verdade".

Era casado e o relacionamento com a mulher era frio, mais uma questão de status que de afeto . Quase não conversavam, salvo sobre questões de dinheiro e ele sempre reclamava de excesso de gastos. Mas terminava cedendo, pois achava melhor do que ouvir, ouvir...

Tinham dois filhos que moravam no Exterior. Pensando bem, exterior é uma boa definição, sempre se sentira distante deles. Não faziam muita falta nem incomodavam, desde que estivessem bem servidos de dinheiro. Aliás, pensava, todos em casa eram uns "sanguessugas" e ele um "burro de carga". Estas auto-argumentações, lógico, eram uma excelente justificativa para seu excesso de dedicação ao trabalho.

Como nem sempre as coisas são previsíveis, a globalização trouxe modificações na estrutura da empresa. Novos interesses, novas metas, estrangeiros assumindo o comando de tudo, e Y. perdendo poder a cada dia. As primeiras manifestações somáticas foram dores nas articulações, sobretudo dos joelhos e pescoço. Dali a pouco, toda a coluna doía. Insônia, inapetência. Começou a perder peso. Sua expressão de cansaço o fazia parecer uma sombra do que era. Estava "murcho" como se tivesse perdido a seiva e a vitalidade.

Paralelamente, o seu humor ficava cada dia mais instável. Brigava em casa, no trabalho, no trânsito. Parecia uma bomba preste a explodir. Os colegas se afastaram ainda mais, os subordinados recebiam a maior parte daquela agressividade que só aumentava. As dores estavam no máximo, caminhar e dirigir eram uns tormentos.

A sua demissão já era esperada por todos, mas para Y. pareceu uma surpresa que aumentou a sua carga de revolta. Saiu dirigindo como um louco. Quando estava no alto da ponte, o carro perdeu o controle e ele caiu no mar, tendo morte imediata. A Policia registrou o fato como acidente e a família recebeu um bom seguro. Mas as pessoas murmuravam que não foi bem assim. Que não resistiu à idéia de perda e preferiu acabar daquela forma , perdendo tudo de uma vez.

    A "ESCUTA" DA DOR

Está provado que a dor crônica induz a alterações psicológicas e vice-versa. Estas zonas de interseção tornam ainda mais necessárias as cautelas diagnósticas para o tratamento . Elas são as verdadeiras causas da dor, mas também são responsáveis por ambigüidades etiológicas que deixam os profissionais confusos e os "dolentes" cada vez mais sofridos e incompreendidos. Buscando os fatores de vulnerabilidade pessoal poderemos dar um passo na ajuda de quem sofre.

A dor, sobretudo a dor crônica, é responsável por sentimentos de incapacidade, cansaço, sedentarismo, desesperança e rebaixamento na qualidade de vida. Além de resultar em altos índices de absenteísmo no trabalho, com custos sociais e financeiros enormes.

Muitas expressões são ouvidas de pacientes para descreverem as suas dores . Traduzir essas descrições em seu aspecto inconsciente é importante para ajudar na exploração desse mundo insondável. Claro está que as palavras têm uma forte influência cultural além do sentimento particular de quem fala.

Podemos, porém, apurar o ouvido, pois ali, na forma como a dor é relatada, pode estar uma importante informação que merece ser considerada como hipótese para investigação.

Uma pessoa que diz : " Meu peito está ardendo como uma fogueira, como se fosse explodir", está falando muitas coisas que podem estar além de uma ameaça de infarto. Pode estar explodindo de emoções com as quais não sabe lidar. Ou poderá evitar o infarto se conseguir outras formas da abrandar a sua fogueira interior.

-"Dói como se me abrissem. Parece que estão me dividindo em dois."

-"Parecem beliscões que vão-me arrancando os pedaços."

-"Dói como uma faca enfiada em minhas pernas. Não consigo andar."

-"Minhas costas doem como se eu carregasse o mundo. Não agüento mais."

-"É como um golpe. Ou golpes que vão e vem, às vezes são mais fortes.

- “Parece que tenho que estar sempre alerta, porque não sei quando o golpe vai chegar."

- "Sinto uma queimação para urinar. Arde e pulsa."

Cada uma dessas palavras retrata como o indivíduo percebe a sua dor e como ela traduz padecimentos que não estão apenas nas partes afetadas do corpo.

Contribuir com esse entendimento ajudará o corpo a livrar-se do peso de ser, também, o representante das emoções

· O QUE DÓI MAIS, PODE DOER MENOS

Z.tinha 33 anos. Solteira, trabalhava desde a formatura em uma sólida empresa governamental. Procura a Psicoterapia por desajustes afetivos. Tivera poucos namorados, que sempre terminavam em muito sofrimento e frustrações. Aliás, o sofrimento já começava antes do relacionamento, pois já o iniciava pensando que não daria certo, que seria traída, rejeitada. Mas a paixão era sempre maior que o medo.

A seqüência era sempre igual:

Agarrava-se ao namorado, não lhe dava um momento de folga. Queria saber tudo o que fizera, pensara, sentira. Queria fazer tudo por ele, pensar por ele, viver por ele. Era capaz de extremos de abnegação e renúncia que, por vezes, a deixavam exausta. A tensão ia crescendo e tornando-se insuportável.

A primeira "falha" ou "defeito" descoberto jogava por terra todos os castelos. A dedicação virava ressentimento, ódio, vontade de vingar-se, de matar.

Desde pequena, sentia-se inadequada. Seus pais, intelectuais e muito dedicados ao trabalho, eram destituídos de capacidade de transmitir carinho e segurança. Exigiam-lhe perfeição, mas preferiam e eram mais tolerantes com as irmãs mais novas.

Z.estudava, estudava, tentando ser um pouco a imagem daqueles pais ou corresponder à imagem que, achava, eles valorizariam nela. Com isso conseguia, a seu ver, apenas mais competição, comparações e inveja das irmãs. E mais sentimentos de inferioridade.

Foi uma adolescente reclusa. Achava-se feia, não tinha amigos. Mais tarde, seus relacionamentos com os colegas de trabalho também eram insatisfatórios. Estava sempre por perto, mostrava-se disponível, mas jamais se considerava convidada por gostarem dela, e simplesmente por "estar ali". Isso a enfurecia, sentia-se relegada e, às vezes, resolvia "desaparecer", para ver se sentiam a sua falta. Depois voltava, "feito um cachorrinho", para ser "chutada outra vez".

Com os chefes, era subserviente. Trabalhava além do horário, mantinha uma atividade febril como para chamar atenção levava trabalho para casa. Mas sempre os colegas eram mais prestigiados que ela - embora fossem, ao seu julgamento, menos qualificados.

Os melhores períodos eram aqueles que não tinha nenhum interesse afetivo à vista. Conseguia dedicar-se à ginástica, fazer trabalhos manuais com muita habilidade, criar formas e cores de grande beleza. Era quando se iniciava novo ciclo e tudo se repetia.

Sentia dores estranhas por todo o corpo, mutantes, inexplicáveis. Um dia doía um lugar, no outro a dor migrava. Só identificava uma coincidência: as dores eram mais fortes nas fases de angústia. Outras épocas, ou não existiam ou eram quase imperceptíveis.

Passou a ser medicada com antidepressivos e ansiolíticos nas fases depressivas, o que foi de grande ajuda para o processo Psicoterapêutico. Num desses episódios, recebeu o diagnóstico de fibromialgia. As dores fibromiálgicas também tinham algum alívio com os antidepressivos.

Hoje, Z. consegue lidar melhor com as perdas, Seus relacionamentos afetivos são mais satisfatórios. Vê os pais sob nova ótica e sente-se mais adequada com colegas e chefes. Sabe que tentar não quer dizer necessariamente conseguir e que a perda é uma hipótese a considerar, não uma fatalidade garantida por antecipação. As raivas perderam o seu ímpeto destrutivo e ganharam em objetividade. Pinta, esculpe, vende seus trabalhos e sente-se reconhecida em seu valor.

Sim, Z. tem dores. Mas sabe identificar porque elas surgem e, sobretudo, que irão embora. As "dores eternas" ficaram no passado. No presente, existe algo novo: uma concepção de que o prazer pode ser valorizado, buscado e considerado possível.

· CONCLUSÃO

Toda dor precisa ser respeitada em sua essência. Aquele que sofre e nomeia o seu padecimento, quer, precisa e merece ajuda.

A "escuta" da dor no processo Psicoterapêutico abre uma porta para a ajuda dos que sofrem, pois permite a reutilização do potencial usado pelo psiquismo para transformar o trauma em dor. Este potencial poderá ser convertido em força propulsora da saúde, ou seja, em arma para o enfrentamento da dor.

O que dói mais, pode doer menos. Quem sofre de dores poderá ter as suas "penas" reduzidas ao descobrir um mundo além da dor. Com a redução do sofrimento interno, encontrará novas perspectivas de vida e novas forças para combater o que motiva a dor - sejam doenças físicas, sejam traumas inconscientes.

Mais uma vez, estão aí Eros e Tanatos em confronto, com possibilidade de vitória do primeiro.

 

Simone Suruagy Psicóloga

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